TUMULTO QUARITERÊ
Pela região do Mato Grosso, o Quilombo do Quariterê estabelecia um governo autônomo e negociava com o Estado português a nível de comércio, ali no final do séc XVIII.


Loc: Espaço Cultural NZAMBI Capoeira Angola, Paranoá

As gentes se derramavam
No rio Galera
Quando um apelido bravio
Guariteré
Fez-se rei daquela terra
Até ter seu sumiço
E ali vindo orquestrar feito
A Benguela
Nem sei de Piolho
Que manso não era
Capoeira em generoso pantanal
Mil cachoeiras
Disputadas entre cabixis
Caburés
Antes mesmo sim
Da expedição
No tempo era ela
Em guerra abundante
A colônia distante
Ofuscada... Mato e água
Ouro indígena
Quilombolas em conflito
Até que as tais bandeiras chegam
Calibres bagunçando tribos
Pela independência
Sem saber seus nomes
Ela sabia
O preço do chão
Do reino
A burocrática esperança
Ruim ao bandeirante
Que armou seu fogo
Recortando a paisagem fria
Com sua roupa tola
De soldado
Em uma resposta evidente:
Achar...
E toda a noite era demora
E cada boca de rio coaxava
A morte não era o medo
O medo era acabar
Em mar doce
Ou na saliência do rio mar
"[...] por maior oráculo o tal piolho, por ter sido, em outro tempo, rei em um quilombo que se dissolveu nos matos da cidade do Rio de Janeiro. Este fiado nas mandingas com que o diabo o trouxe enganado, foi um dos que resistiu, isso depois de algumas ciladas que fez aos soldados. Por isso, acabou a vida diabolicamente: a violência de um tiro que lhe empregaram no corpo" (AMADO & ANZAI, 2006, p. 140).
“em “A Hidra e o pântanos”, o historiador Flávio dos Santos Gomes afirma que as teias formadas por quilombolas com membros externos ao quilombo, propiciavam intercâmbios entre fugitivos, grupos indígenas, vendeiros, negociantes, pequenos proprietários, geralmente de maneira clandestina, e acabavam por se caracterizar como imensos pântanos nos quais as autoridades lusitanas se “atolavam”, pelo fato de estarem inviabilizadas ao abatimento por completo destes espaços." Ver GOMES, Flávio dos Santos. A hidra e os pântanos: mocambos, quilombos e comunidades de fugitivos no Brasil (séculos XVII- XIX). São Paulo: Ed. UNESP; Ed. Polis, 2005, p. 35.
“(...) situado em hum belíssimo terreno muito superior, tanto na qualidade das terras, como nas altas e frondosas mattarias, as excelentes e, actualmente cultivadas margens dos rios Galéra, Sararé e Guaporé: abundante de caça, e o rio de muito peixe, cujo rio é da mesma grandeza do Rio Branco. A bandeira achou no Quilombo grandes plantações de milho, feijão, favas, mandiocas, manduin, batatas, caraz, e outras raízes, assim como muitas bananas, ananazes, aboboras, fumo, gallinhas e algodão de que faziam panos grossos e fortíssimos com os que se cobriam” (AMADO & ANZAI, 2006)
"O Quilombo liderado por Teresa de Benguela, atacado em 1770 e 1795, para ter existido por dezenas de décadas, longe de estar isolado, só ganhou viabilidade pelas complexas alianças e relações formadas tanto com aqueles que permaneciam no bojo da sociedade escravista - assenzalados ou contrabandistas – como com os próprios povos indígenas do extremo oeste das consideradas possessões portuguesas. Especialmente com estes últimos, como vimos acima, viabilizou sua existência material na possível utilização de técnicas agrícolas trazidas por mulheres indígenas Pareci-Cabixis que haviam sido raptadas - fato que surpreendia até mesmo habitantes dos povoamentos lusitanos que no mesmo período enfrentavam carestia. Em todo caso, a reflexão sobre as trocas culturais de quilombolas e indígenas, no seio do Quilombo Grande, ainda está por merecer análises mais aprofundadas. Contudo, a despeito das atuais limitações, estamos diante da história de homens e mulheres que se valeram de todos os meios possíveis para manutenção da liberdade e, para tanto, pegaram em armas, se assimilaram ou deixaram-se ser assimilados a culturas diversas." (RODRIGUES, 2016)
Fonte:
AMADO, Janaína; ANZAI, Leny Caselli (ORGS.). Anais de Vila Bela, 1734-1789. Col. Documentos Preciosos. Cuiabá: EdUFMT, 2006.
GOMES, Flávio dos Santos. A hidra e os pântanos : mocambos, quilombos e comunidades de fugitivos no Brasil (séculos XVII-XIX). São Paulo: Unesp, 2005.
JUNIOR, Emmanuel de Almeida Farias. Negros do Guaporé: o sistema escravista e as territorialidades específicas. 2011, RURIS - Revista do Centro de Estudos Rurais, v. 5, n. 2, 2011.
RODRIGUES, Bruno Pinheiro. 'Aruaquização': para outra possível leitura do Quilombo Grande (1730-1795). Territórios e Fronteiras (Online) , v. 9, p. 285-302, 2016.

